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Autoconhecimento

Do sonho à realização: uma mão amiga pode transformar e salvar vidas

Lutar contra o bullying, a depressão e o suicídio é uma das minhas principais missões e, muitas vezes, uma palavra pode fazer toda a diferença

 1 de junho de 2017
14 min de leitura

Do sonho à realização - Uma mão amiga pode transformar e salvar vidas

Quando eu conheci o Fernando, ele era o típico adolescente. Gordinho, cheio de espinhas, tímido. Éramos colegas do curso de teatro do Wolf Maia e, quando aquele menino subia no palco, ele se transformava.

Talentoso, interpretava, cantava e nos encantava. Eu era uma das mais velhas do curso e me identifiquei com aquele garoto calado, mas que tinha um mundo de energia dentro de si.

Nós nos aproximamos, e percebi que ele passava pelos mesmos problemas que eu havia sentido na pele, quando adolescente. Rejeição, baixa autoestima, bullying… Ficamos amigos

Até que uma noite meu telefone tocou. Era a mãe dele. E ela estava desesperada. Há dias, o Fê não saia da cama, não queria comer, não queria tomar banho, enfim, não queria viver… Ela não sabia mais o que fazer.

Como eles moravam longe de mim, fiquei receosa de ir sozinha e pedi a minha vó que me acompanhasse. Chegando lá, deitei-me ao lado dele na cama, minha vó numa cadeira ao lado, e conversamos por horas e horas!

Mostrei-lhe o quão talentoso ele era, quantas qualidades possuía e quantas coisas lindas e maravilhosas ele ainda tinha para fazer na vida.

Depois de um tempo, o papo foi ficando mais leve e, quando eu saí de lá, ele já estava brincando e sorrindo. Mas eu nunca imaginei o quanto aquele papo representaria na vida do Fernando!

Quando uma palavra pode mudar tudo

Do bullying ao Direito - Conheça a história de Fernando

Algum tempo depois, o Fernando me procurou e me revelou toda a sua história.

Desde pequeno, ele se sentia rejeitado, e isso o levava a ter baixa autoestima. As “brincadeiras” no colégio tornavam o local um suplício diário para o menino.

“Quando eu chegava ao colégio, os meus colegas de sala me davam chave de pescoço, me jogavam no chão e se jogavam todos em cima de mim… Eram quatro ou cinco pessoas. Eu sempre ficava ‘apreensivo’ de ir ao colégio. Teve uma vez que eu nunca vou esquecer. Foi em um brinquedo de um fastfood muito conhecido. Eu tinha meus 10 ou 11 anos de idade. Era aniversário de uma colega do colégio. Todos tinham subido no brinquedo para, na parte mais alta, ficar de casaizinhos e dar os primeiros beijos. Ao subir, eu fui empurrado para baixo com falas de ‘Sai daqui! Ninguém quer você aqui não! Sai!’  E todos riram. Lembro isso até hoje”, ele me contou.

Além dos problemas na escola, ele enfrentava algumas crises na família, e aquela situação foi ficando cada vez mais insustentável. Até que um dia já com 20 anos ele resolveu tomar uma atitude extrema.

“Depois de um momento muito traumático para mim, tomei 40 comprimidos de um remédio a que eu era alérgico, deitei no meu quarto e fiquei à espera do fim. Não tinha mais sentido ou prazer em viver, e aquela me parecia ser a única alternativa possível. Certo de que tinha tomado uma atitude certa, me levantei e avisei meus pais e eles, desesperados, me levaram para o hospital e eu sobrevivi. A partir dali pensei que tudo melhoraria. Não melhorou”.

A depressão continuou a rondá-lo. Mesmo com coisas boas acontecendo na vida dele, nada o fazia feliz e completo. Ele não se sentia merecedor das coisas boas que vinham acontecendo. Tudo que ele começava, ele não conseguia concluir. A vida foi ficando cada vez mais embotada e episódios de choros continuados e de dias na cama foram se tornando recorrentes.

Até acontecer o fato que já relatei acima, da ligação da mãe dele para mim e de minha visita à casa dele.

“Quando minha mãe me disse que havia lhe ligado e você estava vindo para casa eu não acreditei. Como que uma pessoa como você sairia de casa no meio da noite só para vir ficar comigo! Mas você veio, se deitou ao meu lado e foi me ajudando a enxergar que eu realmente tinha talentos, que havia inúmeras possibilidades para minha vida e que não havia problema que não pudesse ter solução. Você não precisava estar comigo, não tinha nenhum interesse que a levasse lá. Você foi conversar comigo por ser simplesmente minha verdadeira amiga. E, se uma pessoa como você podia me enxergar como amigo, é porque eu tinha qualidades. Então, só dependia de mim conseguir me mostrar mais para pessoas. Por isso, tenho certeza de que aquele nosso papo, naquele dia, me deu a força que eu precisa para renascer. Só dependia de mim conseguir mostrar as minhas qualidades para as pessoas e buscar o meu sucesso. Foi isso que fiz e posso dizer que hoje sou capaz de conquistar tudo o que eu quiser.”

Hoje, o Fernando está terminando a faculdade de Direito, trabalha no departamento jurídico de uma superempresa, tem plano de viajar o mundo, as espinhas ficaram para trás, e ele esbanja confiança e autoestima. E faz questão de compartilhar a sua história para que pessoas que passam pelo mesmo problema possam ver que existe sempre uma possibilidade de mudança. Que orgulho desse amigo!!!

“Quando tivemos aquele papo e você me mostrou os problemas que também tinha passado, de certa forma, me deu um estalo de que tudo poderia mudar. Se você nunca tivesse me contado suas experiências, talvez eu não tivesse me tocado. Por isso, hoje, faço questão de contar minha história também para que as pessoas vejam que elas não são a primeira nem a última pessoa que podem passar por isso. Se olharmos em volta, muitos de nós vemos exemplos de superação como o meu e enxergam que é, sim, possível melhorar a autoestima e a vontade de viver. Nós somos capazes de tudo que quisermos, basta traçar objetivos, caminhos e seguir por eles. Isso facilita, ainda mais quando vemos nossos resultados depois. E também muito importante: alguém vai gostar de você como você é. Seja um amigo ou um relacionamento amoroso, você vai ter alguém que vai amar seus defeitos e suas virtudes. Eu só acreditei nisso quando vi, com o tempo, que era real. Eu nunca achei que alguém ia ‘me amar’ (risos). Mas me amaram, sim, e é uma sensação incrível.”

E completa. “Ao contar minha história, as pessoas responsáveis por crianças que têm algum comportamento introspectivo, podem passar a entender mais intimamente o que pode estar acontecendo e começar a cuidar melhor do lado emocional dessa criança ou adolescente. O emocional é subjetivo e, muitas vezes, uma depressão é confundida com vergonha, com uma característica de pessoa introvertida. Isso está mudando, e as pessoas estão entendendo os reais motivos de tais atitudes ou ‘jeitos’. Infelizmente, isso era uma realidade muitas vezes tratada como ‘exagero’ da criança e muito como ‘Magina, era só brincadeira’. Não. Isso não tem nada de brincadeira.”

Ajudar as pessoas

Conheça a história de superação de Fernando

E foi por histórias como a do Fernando que, quando escrevi o meu livro “Do sonho à realização” fiz questão de compartilhar alguns casos de bullying pelos quais passei na minha adolescência. Fiz porque eu acredito que esse tema deva ser cada vez mais discutido e debatido.

E fico feliz de ver o assunto sendo retratado em séries, livros e reportagens, pois creio que só a conscientização pode ajudar a terminarmos com esse incrível mal.

A série 13 reasons why, da Netflix, por exemplo, causou grande polêmica por abordar a história de uma adolescente que, de tanto sofrer bullying, acaba tirando a própria vida. Muita gente julgou a abordagem exagerada, dizendo que boa parte dos fatos pelos quais a menina passou eram “coisas normais”e que não justificavam o ato extremo. Claro que não justificam, mas há algo que justifique? A questão é: só quem passa pelo bullying é que pode julgar o quanto aquilo a afeta, e não somos nós que podemos analisar!

 

Depressão e suicídio

Mais do que uma simples brincadeira de criança, o bullying pode levar as pessoas à depressão e, no extremo, ao suicídio! Por isso, devemos tratar o tema com todo o cuidado possível e com toda a seriedade que ele exige!

Afinal, esses males são verdadeiras epidemias globais.

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, a depressão afeta 322 milhões de pessoas no mundo. Em 10 anos, de 2005 a 2015, este número cresceu 18,4%. A prevalência do transtorno na população mundial é de 4,4%.

No Brasil, 5,8% da população sofre com esse problema, que afeta um total de 11,5 milhões de brasileiros. Segundo os dados da OMS, o Brasil é o país com maior prevalência de depressão da América Latina e o segundo com maior incidência nas Américas, ficando atrás somente dos Estados Unidos, que têm 5,9% de depressivos.

E, se os números da depressão são assustadores, os de suicídio não ficam atrás. Em 12 anos, a taxa de suicídios na população de 15 a 29 anos subiu de 5,1 por 100 mil habitantes, em 2002, para 5,6 em 2014 – um aumento de quase 10%.

Os números divulgados pela BBC Brasil são do Mapa da Violência 2017, estudo publicado anualmente, com base em dados oficiais do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde.

Um olhar atento diante de uma série histórica mais longa de dados permite ver que o fenômeno não é recente nem isolado, em relação ao que acontece com a população brasileira. Em 1980, a taxa de suicídios na faixa etária de 15 a 29 anos era de 4,4 por 100 mil habitantes; chegou a 4,1 em 1990, e a 4,5 em 2000. Assim, entre 1980 a 2014, houve um preocupante crescimento de 27,2%.

No mundo, estima-se que o suicídio seja a causa da morte de mais de 800 mil pessoas por ano, das quais 75% dos casos são registrados em países emergentes e pobres, não nas capitais escandinavas, como a cultura popular insiste em pensar. A cada 40 segundos, uma pessoa se suicida no mundo, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde).

 

Um craque que também precisou de ajuda

Ainda bem que muitas pessoas vêm atentando para a importância de se abordarem esses temas tabus, porque é só alertando, contando e compartilhando histórias pessoais que podemos encarar tais problemas.

Recentemente, o mundo foi surpreendido com a biografia do jogador de futebol multicampeão pelo Barcelona, campeão da Copa do Mundo pela Espanha, Andrés Iniesta, que revelou que, quando tinha 25 anos, se viu no fundo do poço.

Tetracampeão da Liga dos Campeões, campeão da Copa de 2010, titular do Barcelona, e poucos meses depois de fazer o gol que levou o time à final da Liga dos Campeões 2008/2009, o meiocampista entrou em parafuso. Uma tristeza sem explicação, agravada pela morte de um amigo, ameaçou a saúde do jogador. “Tudo começou depois de viver o que deveria ser o verão mais glorioso da minha vida. De repente, você começa a ficar mal. Não sabe por quê… Mas um dia está mal. E no dia seguinte também. E assim, dia após dia, não melhora”, conta Iniesta, em trecho do livro “A jogada da minha vida”.

A revelação é uma excelente forma de mostrar a todos que a depressão pode afetar qualquer pessoa, até mesmo aquelas que nos parecem quase super-humanos. No livro, o espanhol conta que a ajuda dos médicos do clube o fez superar o problema, mas… e se Iniesta não tivesse procurado ajuda, como teria sido o fim dessa história?

A vida é maravilhosa e uma dádiva! Mas há uma doença terrível e silenciosa que, em algum momento, impediu que pessoas como o Fernando, o Iniesta e tantas outras vissem as belezas da nossa existência.

Por isso, se perceber que alguém ao seu lado precisa de ajuda, estenda a mão, empreste um ombro. Às vezes, uma palavra ou uma visita podem fazer toda a diferença. É o que faço com as pessoas que me rodeiam e pretendo inspirar mais e mais pessoas a procederem assim. Não há nada que o amor não ajude a curar! Acredite nisso e não desista nunca de alguém que você ama… ou de você mesmo. Como disse meu amigo Fernando, não há problema que não tenha solução.

Gostaria de terminar agradecendo ao Fê por ter aberto seu coração e pela coragem de compartilhar essa linda história que certamente servirá de inspiração e motivação para muitas pessoas! Fê, você é um amigo que eu amo muito e a nossa amizade é extremamente especial pra mim! Tenho certeza de que seremos amigos pra toda eternidade! Obrigada por ser essa pessoa tão incrível e querida!

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Rê Spallicci