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Autoconhecimento

O resgate da empatia e da amorosidade pela comunicação humana

A Profa. Titular pela Escola de Enfermagem da USP e mestre em comunicação interpessoal, Maria Júlia Paes da Silva, fala sobre a importância da comunicação não verbal nas relações humanas.

 9 de junho de 2016
7 min de leitura

O resgate da empatia!

Vivemos em um tempo dominado pela tecnologia e pela comunicação. Hoje, com um simples toque na tela de um celular, conseguimos falar com quem quer que seja em qualquer lugar do globo terrestre, bastando apenas uma conexão wi-fi. O mundo ficou menor, as distâncias foram encurtadas, mas será que estamos realmente mais próximos?

Quantas vezes observamos pessoas juntas ao redor de uma mesa, e cada uma delas com seus olhos vidrados na tela do celular? Quantas vezes, nós mesmos deixamos de dar importância para o que acontece ao nosso redor, porque estamos hipnotizados pelos nossos smartphones? A tecnologia nos aproximou em tese, mas, na realidade,  está nos distanciando.

Como fazer para retomar nossa essência? Como fazer para olharmos novamente nos olhos daqueles com quem  nos relacionamos, como voltarmos a ser mais humanos e menos máquinas?

A Profa. Titular pela Escola de Enfermagem da USP e mestre em comunicação interpessoal, Maria Júlia Paes da Silva, autora dos livros  “Comunicação tem remédio”, “O amor é o caminho – maneiras de cuidar”,  entre outros, responde a estas perguntas.

Usando o seu meio de atuação, a área de saúde como exemplo, ela traça um paralelo sobre de que modo podemos resgatar conceitos como empatia e amorosidade no nosso dia a dia. “Eu digo que a medicina, nos últimos anos, tem cuidado muito das doenças e pouco da saúde. Tivemos avanços fantásticos no que diz respeito a diagnósticos por imagem e tratamentos, mas os profissionais da saúde esqueceram que, quando nos relacionamos com nossos pacientes, somos pessoas lidando com pessoas. Olhar no olho do paciente, tocar com carinho e sempre com a permissão do paciente, manter um diálogo carinhoso são também armas poderosas no cuidado com as pessoas.”

Maria Júlia conta que, ao longo dos seus anos de experiência cuidando de pacientes graves, ela observou que, por mais complexo ou grande que fosse o objeto que ela manejasse para fazer algum procedimento nos seus pacientes, eles sempre olhavam primeiramente em seus olhos, para só depois olhar em suas mãos.

“Isso porque a nossa essência humana possui uma comunicação que é muito mais forte que a comunicação verbal, que é a linguagem psicobiológica, a linguagem das nossas expressões faciais, universal na raça humana.”

E é a observação dessa linguagem que temos perdido em nosso dia a dia. Ao reduzir nossos relacionamentos por conexões intermediadas por máquinas, perdemos a oportunidade de ler essas expressões e, consequentemente, de sentir compaixão e empatia.

“As palavras compaixão e comunicação têm a mesma raiz. E, quando perdemos a capacidade de nos comunicar em toda nossa potencialidade humana, perdemos também a capacidade de compaixão, de nos colocar no lugar do outro, de ter empatia, de sentir amor pelo próximo”, revela Maria Júlia.

As dimensões da linguagem

Em seu artigo, COMUNICAÇÃO E O RESGATE DO SER: O PAPEL DA COMUNICAÇÃO NA HUMANIZAÇÃO DA ATENÇÃO À SAÚDE, a enfermeira Maria Júlia destaca que existe um provérbio árabe muito interessante que afirma que “a mente é como vento, e o corpo, como a areia. E você quer conhecer o vento, observe o movimento da areia”. “Esse provérbio nos lembra de que nenhum de nós fala tudo que pensa e sente, mas, quando observamos o outro atentamente (ou somos observamos pelo outro), quando estamos atentas ao seu comportamento (ou estão atentos ao nosso comportamento e ao nosso discurso), somos capazes de entender o que estão pensando, sentindo, e vice-versa, o que nós pensamos, o que sentimos; por isso, a comunicação pode ser entendida como a base do cuidado terapêutico.”

Ainda segundo Maria Julia, os sinais não verbais podem ser divididos de diferentes formas, e os aspectos que não podem ser esquecidos são: o paraverbal, ou seja, a forma como o som é produzido, e o cinésico que é a famosa linguagem do corpo. São os nossos movimentos, desde os gestos manuais, até os meneios de cabeça e as expressões faciais,  a proxêmica, que é o uso que o homem faz do espaço enquanto produto cultural específico, a distância mantida entre as pessoas numa interação,  a comunicação tátil, entre outras.

Todas essas dimensões não verbais não deixam de existir em nenhum momento quando nos propomos a nos comunicar com alguém, e estarmos atentos a elas  pode fazer toda a diferença para uma comunicação realmente humana. “Quando nos propomos a cuidar das pessoas, elas estão ainda mais atentas a essa dimensão não verbal. O tamanho do vocabulário não verbal do paciente se expande em situação de estresse, e dentro da situação de estresse dispende mais energia para tornar seus sentidos alertas para perceber o perigo. Nessas situações, os pacientes buscam por alguma informação que reduza o desconforto do seu estresse. Por isso, buscam nas nuances dos discursos e do não verbal dos enfermeiros, dos médicos, dos profissionais da saúde, comportamentos que possam esclarecer a própria situação que ele esteja vivendo”, explica.

E assim como na área da saúde, nossas relações interpessoais devem ser sempre baseadas na observação dessas dimensões, para que possamos realmente nos colocar no lugar do outro, entender suas necessidades, seus medos e suas ansiedades. Será que andamos observando as linguagens não verbais do nosso par, dos nossos pais, dos nossos filhos? Será que estamos tendo relações verdadeiramente humanas?

Às vezes, ficamos tão envolvidos nas “loucuras” da rotina diária que acabamos esquecendo que o nosso objetivo de vida não deveria ser mudar o mundo, mas sim, tocar qualitativamente a vida das pessoas que estão ao nosso redor, fazendo diferença positiva nos momentos em que nos relacionamos com elas.

“Somos livres para decidir as causas ou pessoas que merecem nossa atenção, e usar o nosso corpo, a nossa expressão, as nossas palavras, como instrumento de recuperação de cuidado e de cura. Parece-me, então, que a comunicação é fundamental no resgaste da atenção à saúde e no resgate do próprio ser humano”, finaliza Maria Júlia.

renata-maria-julia

Maria Júlia Paes da Silva é Profa. Titular pela Escola de Enfermagem da USP, com mestrado, doutorado e livre docência na área de comunicação interpessoal. Pesquisadora Nível 1A do CNPq. Autora dos livros: Comunicação tem remédio; O amor é o caminho – maneiras de cuidar; Qual o tempo do cuidado?; Liderança em 5 atos; entre outros.

 

 

 

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