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Gestão e Liderança

Liderança – Não existe mais espaço para o modelo de comando-controle

Diretor da Associação Brasileira de Recursos Humanos, ABRH-SP, Luiz Drouet, fala sobre o cenário do mercado de trabalho e de liderança no mundo pós coronavírus

 11 de junho de 2020
9 min de leitura



Tenho escrito muito por aqui sobre as transformações profundas pelas quais o mundo corporativo está passando, e ainda experimentará, em virtude da pandemia do coronavírus e do consequente processo de isolamento social.

Teremos novas empresas, novos líderes, novas formas de nos relacionarmos com clientes, fornecedores, empregados e empregadores.

E, para falar um pouco mais sobre este tema, hoje converso com Luiz Drouet,  diretor da ABRH-SP (Associação Brasileira de Recursos Humanos). Em nosso papo abordamos desde o mercado de trabalho pós-pandemia, passando pelas competências do profissional do futuro, até as questões de diversidade e empoderamento feminino.

Acompanhe:

Renata Spallicci – Qual é a leitura do mundo corporativo no atual momento e na retomada das atividades?

Luiz Drouet –A pandemia impactou diretamente nas operações, e as organizações tiveram que se adaptar rapidamente ao novo cenário. Alguns setores e mercados foram profundamente impactados (ex.: turismo, varejo de lojas físicas de bens não essenciais, etc) e, do outro lado, empresas da área de tecnologia, delivery e e-commerce apresentaram crescimento de demanda neste período.

RS – As empresas têm demonstrado agilidade, do ponto de vista de organização e processos para se adaptar?

LD – Algumas se mostraram mais preparadas que outras. Sem dúvida quem já estava em uma jornada avançada de transformação digital e com uma cultura organizacional que favorecesse a inovação, baseada em metodologias ágeis, se adaptaram mais rapidamente e sofreram menos com o impacto.

RS – Quais os desafios e aprendizados que trabalho remoto traz? Acredita que o home-office, as telerreuniões e um uso mais intenso das tecnologias são tendências que vieram para ficar?

LD – Certamente o cenário de isolamento social acelerou em poucas semanas o que normalmente levaria anos ou décadas para mudar a forma como profissionais e empresas trabalham. Mesmo organizações e gestores mais resistentes ao home-office, foram obrigados a experimentar o modelo do trabalho remoto e reconhecer seus benefícios. É um caminho sem volta. Ao mesmo tempo, a forma de liderar e gerir processos, projetos e pessoas também muda nesse contexto. A relação necessariamente precisa estar baseada na confiança. Não existe mais espaço para o antigo modelo do comando-controle.

RS – Quais as principais mudanças que as organizações devem viver no novo normal?

LD – Processos mais ágeis, em constante melhoria e preparados para diferentes cenários, adaptando-se à  mudança. O mundo VUCA (em português, volátil, incerto, complexo e ambíguo) veio para ficar e, cada vez mais, exigirá flexibilidade, capacidade de adaptação e aprendizado rápido dos profissionais.

RS – A expectativa de uma queda no PIB e de uma consequente recessão traz também a ameaça do crescimento do desemprego. Como a ABRH avalia esse momento?

LD – Infelizmente é uma realidade esperada. Logo no início da crise, apoiamos o Movimento Não Demita, convidando os empresários e executivos a não desligarem colaboradores, salvo nos cenários em que  esta medida fosse a última e única opção. Mesmo assim, entendemos que muitas organizações precisaram reduzir seus quadros para garantir a sobrevivência de seus negócios. Esperamos que a economia volte a crescer o mais rápido possível, para que esses profissionais possam ser recontratados. Até lá, dado o cenário extraordinário, espera-se que os governos federal, estadual e municipal garantam medidas de apoio à população mais vulnerável e para as empresas que correm o risco de interromperem suas operações.

RS – O novo normal deve exigir organizações mais ágeis na leitura do ambiente e na tomada de decisões… Como as empresas devem se preparar para enfrentar esse novo momento?

LD – Por um lado, uma leitura constante do ambiente externo, para se antecipar às mudanças e, do outro, uma cultura ágil, utilizando ferramentas e metodologias que permitam rápidas adaptações a diferentes cenários, evoluindo sempre na entrega de valor para os seus clientes e preservando um ambiente que favoreça o engajamento e contínuo desenvolvimento de seus colaboradores.

RS – E qual deve ser o papel do líder nesse novo cenário que se apresenta? 

LD – O líder precisa guiar a organização nesse processo de transformação para um modelo mais ágil e adaptativo. Outra característica é a vulnerabilidade, tão importante para a construção de confiança com os seus times, na medida em que reconhece que não há respostas para todas as perguntas, mas com muita coragem busca continuamente encontrar soluções para os problemas, envolvendo e engajando as pessoas.

RS – Você acredita que teremos também uma mudança no perfil do novo profissional? Quais competências devem ser mais valorizadas e quais podem perder força?

LD – O World Economic Forum (Fórum Econômico Mundial) apresentou, em 2018, um estudo (Future of Jobs) que aponta dez habilidades do futuro, projetando o tempo presente. Com o contexto da pandemia, essas competências comportamentais ganharam ainda mais relevância e representam fatores-chave para a sobrevivência de profissionais e organizações nos tempos atuais. São elas: 1) Solução de problemas complexos, 2) Pensamento Crítico, 3) Criatividade, 4) Gestão de pessoas, 5) Empatia, 6) Inteligência Emocional, 7) Bom senso e tomada de decisão, 8) Orientação para serviço, 9) Negociação e 10) Flexibilidade cognitiva.

RS – Como as empresas podem preparar seus líderes e seus profissionais para esse novo momento?

LD – É consenso  que as empresas devem apoiar seus colaboradores e líderes em um processo profundo de requalificação, com foco em habilidades técnicas ligadas à tecnologia, mas, principalmente, com ênfase em competências comportamentais, como as apresentadas pelo World Economic Forum, no estudo Future of Jobs. Por mais protagonistas que os profissionais precisem ser para aproveitar as oportunidades de formação cada vez mais disponíveis e acessíveis no mercado, as organizações devem guiar e incentivar esse processo, sob o risco de, mesmo em um contexto de milhões de desempregados, não dispor de um quadro de colaboradores atualizados e preparados para os desafios do mercado atual e futuro.

RS – Queremos abordar um assunto voltado às mulheres. Um dos pontos apontados por estudiosos sobre a desigualdade no mercado de trabalho para homens e mulheres tem muito a ver com a forma como a sociedade sempre se organizou, ou seja, a mulher tendo mais responsabilidades domésticas do que os homens. Muito se fala que o aumento do teletrabalho pode equiparar um pouco as condições nesse sentido. Você acredita nesta mudança estrutural e em consequências positivas para as mulheres?

LD – A ABRH-SP levanta a bandeira do empoderamento feminino há alguns anos, mediante diversas iniciativas, com destaque para o CONALIFE – Congresso Nacional de Liderança Feminina. Além disso, é apoiadora do movimento HeForShe (Eles por elas) da ONU Mulheres, pois acreditamos que a igualdade de gênero só será conquistada plenamente, por meio de  um profundo engajamento de homens e mulheres nesta jornada. A pandemia muda nossos hábitos e realidades, fortalecendo discussões como esta, e precisamos garantir que elas repercutam na nossa sociedade, a fim de  compreendermos as mudanças necessárias para que homens e mulheres tenham as mesmas oportunidades.

RS – Em meio a toda reflexão que a pandemia tem gerado, como o respeito ao meio ambiente e uma ordem mundial mais igualitária, fatos novos no Brasil e no mundo colocaram em pauta a questão do racismo e da intolerância. Esse é um tema que as empresas no Brasil precisam encarar? Como o mundo corporativo e, em especial, o RH pode contribuir para transformar essa situação? E qual a importância de que essa discussão ganhe espaço, nesse momento, também dentro das empresas?

LD – Infelizmente, as organizações não estão livres desses problemas que nos envergonham enquanto sociedade. As empresas e líderes podem e devem contribuir para a educação de suas comunidades internas, esclarecendo práticas que já não são permitidas, advertindo e punindo exemplarmente casos internos. Felizmente percebe-se esforço e compromisso relevantes de empresas em busca de práticas de inclusão e diversidade que estão impactando significativamente seus processos, desde atração e seleção, até desenvolvimento e progressão de carreira, oferecendo oportunidades para minorias e corrigindo falhas que impedem com que diferentes pessoas tenham acesso às mesmas oportunidades.

Agradeço ao Luiz pelo papo bastante esclarecedor e tenho certeza de que os pontos abordados aqui são essenciais para todos aqueles que trabalham no mundo corporativo ou até mesmo pensam em empreender e formar equipes!

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Rê Spallicci